quarta-feira, 30 de março de 2011

Câmbio manual ou automático?

Outro debate eterno entre donos e prospectivos de TR4 é a escolha do câmbio: comprar manual ou automático?

Pessoalmente, possuo uma TR4 automática e não trocaria por nada. Mas reconheço que há casos de uso onde o câmbio manual vai melhor. Se você quer extrair a última gota de performance do carro (ainda que a proposta de um jipe não seja exatamente esta), vá de câmbio manual.

As desvantagens genéricas do câmbio automático são, a meu ver, as seguintes:
  • Num câmbio de apenas 4 marchas (como é a maioria deles, TR4 inclusive), a distância entre primeira e segunda marchas é muito grande, o que prejudica a performance. Sensação de "lerdeza" do carro.
  • O consumo de combustível é maior (uns 10%), dadas as perdas no conversor de torque, mais uso do freio e uso de RPM mais alta quando o motor é exigido (pois a caixa reduz quando se pisa a fundo).
  • Não é feito para "dar pau"; quebrará ou sofrerá desgaste prematuro se for usado para tirar racha, cantar pneu, essas coisas.
  • A manutenção é muito mais cara, embora só vá incomodar se o motorista "der pau".
  • O motorista precisa ficar atento às situações de superaquecimento do óleo da caixa.
  • Ruído do motor (RPM) não corresponde exatamente à velocidade, o que pode incomodar motoristas acostumados a dirigir "de ouvido".
Agora, as vantagens genéricas do câmbio automático:
  • Conforto ao dirigir;
  • Conforto e facilidade ao manobrar;
  • Libera a mão para acariciar as pernas da passageira :)
  • Abundante força para sair do lugar (morro acima, manobrando etc.), graças ao conversor de torque. Evita ter de acelerar e arrastar embreagem, sai quase na lenta;
  • Não há uma embreagem para queimar.
Em relação ao câmbio automático oferecido na TR4 (modelo Aisin V4AW4), as desvantagens específicas são as seguintes:
  • A TR4 é um carro pesado e com motor "pequeno", a performance já não é estelar, e fica pior ainda com câmbio automático. O motorista que gosta de correr definitivamente não vai ficar satisfeito.
  • Câmbio é mais "burrinho" que os oferecidos em sedãs como Toyota Corolla. Por exemplo, o Corolla reduz a marcha se o motorista freia. O da TR4 só presta atenção ao acelerador.
  • Não oferece diferentes modalidades (e.g. esporte, econômico, neve), coisa relativamente comum em outros câmbios de quatro marchas.
E as vantagens específicas:
  • TR4 automática tem maior valor de revenda;
  • Tanto o fabricante (Aisin) quanto o modelo (AW4) têm fama de grande confiabilidade;
  • A caixa do câmbio automático é selada e tem menos chances de contaminação ao passar na água ou lama. (Num câmbio manual, e "proibido" trocar de marcha nestas situações pelo risco de contaminar a embreagem.)
  • O óleo da caixa é refrigerado ativamente via radiador do motor, então a chance do óleo superaquecer é pequena, mesmo em uso severo.
  • Na maioria das situações de off-road, a suavidade da transmissão automática é vantajosa, evita patinar "de graça", perder tração entre troca de marchas etc.
Bem, as cartas estão na mesa. Agora a decisão é sua.

Ei! Superaquecimento do óleo da caixa? Que droga é essa?

Na maioria dos câmbios automáticos, TR4 inclusive, a força do motor é transmitida hidraulicamente, ou seja, por movimento de óleo. Não há conexão direta entre motor e transmissão (quer dizer, às vezes há; veja o próximo tópico), o que elimina a necessidade da embreagem e dá "aquela" suavidade ao carro automático.

O componente que faz este trabalho é o conversor de torque. Há inúmeros artigos na Internet que explicam bem como ele funciona, então não vem ao caso repetir aqui.

O ponto é: toda transmissão de energia por meio hidráulico tem perdas. Se o motor produz 100HP, apenas 95HP são transmitidos; 5HP são perdidos. 

E onde esses 5HP vão parar? No próprio óleo, em forma de calor. Note que 5HP equivalem a 3680W, é como se o óleo estivesse sendo continuamente aquecido por um chuveiro na posição "outono".

Assim, todo caixa automática decente tem meios de resfriar este óleo. No caso da TR4, ele passa por dentro do radiador do motor. A temperatura ideal do óleo é a mesma da água do motor (uns 90 graus).

Infelizmente, não é difícil ultrapassar a capacidade de resfriamento. Basta acelerar fundo e frear forte ao mesmo tempo, mantendo o carro parado. O motor vai atingir uns 2500 RPM, produzindo 40HP ou mais, que estão integralmente virando calor porque o automóvel não pode andar.

Bem, isto seria a forma propositada de superaquecer o óleo. E isso pode acontecer "sem querer"? Sim, basta uma situação em que seja preciso acelerar muito e o carro ande pouco. Off-road pesado, rebocando trailer, são situações "perigosas". Transmissões com refrigeração insuficiente podem superaquecer até subindo uma serra.

São situações onde um carro com câmbio manual queimaria a embreagem. A diferença é que trocar a embreagem sai muito mais barato que dar manutenção em câmbio automático. Uma simples troca do óleo sairá caro (custa 100 reais o litro, cabem 7 litros, e provavelmente será feita uma "lavagem" com óleo novo para não precisar abrir a caixa, substituindo-se novamente em seguida).

Na TR4, segundo o manual, o painel mostra um "N" piscando quando isto acontece. Não aconteceu comigo ainda, mas se acontecer, é bom parar, mantendo o motor ligado e o câmbio em N, para o óleo circular e esfriar. É um aviso antecipado que, se atendido, evitará danos ao óleo e à caixa.

Embreagem de travamento (lockup clutch)

Na última década, todo conversor de torque tem saído com uma embreagem de travamento. Embora seu funcionamento seja bem diferente de uma embreagem convencional, seu efeito prático é o mesmo: acoplar diretamente o motor à transmissão.

Quando isto acontece, o óleo deixa de transmitir a força, porque todas as peças do conversor de torque, inclusive o próprio óleo, estão girando à mesma velocidade.

Nesta condição, a eficiência do conversor de torque é 100% e o óleo não esquenta, o que diminui o consumo de combustível.

Para manter a suavidade da transmissão automática, a embreagem só trava em determinadas condições, e o motorista desavisado nem vai notar:
  • Marchas mais longas (terceira, quarta) que têm menos força;
  • Pisando pouco no acelerador;
  • Não estar pisando no freio;
  • Desenvolvendo velocidade razoável.
Na prática, estas condições são observadas quando estamos dirigindo em rodovia. No frigir dos ovos, a embreagem de travamento é um meio de diminuir o consumo em auto-estrada.

Esta embreagem é automática. Seu estado "normal" é desacoplado, e ela sempre desacopla antes de trocar de marcha. Assim, quando se pisa a fundo na estrada, o carro dá dois pequenos trancos, como se tivesse mudado de marcha duas vezes, mas na verdade a primeira "troca" foi a embreagem desacoplando.

O conversor de torque tem um efeito multiplicador de torque (por isso o nome), então quando o motorista pisa um pouco mais, a embreagem "larga" para deixar o conversor trabalhar, mesmo que não haja redução de marcha. Isto cria a sensação de haver uma marcha "três e meia", levando alguns motoristas a pensar que seu câmbio tem 5 marchas.

Manuais técnicos Pajero Pinin/iO/TR4

É possível encontrar na Internet os manuais de manutenção da Pajero Pinin/iO/TR4. Como se sabe, os três nomes referem-se ao mesmo carro; nomes diferentes foram adotados neste ou naquele país por razões mercadológicas.

São manuais em inglês, referentes ao modelo 2002. Apesar da "antiguidade" dos manuais e da evolução diferenciada da TR4 no Brasil (como o motor flex), a equivalência entre manual e veículo é praticamente 100%. A única coisa que realmente difere é o motor, em particular a distribuição, que provavelmente foi mudada por conta do etanol.

Para facilitar a nossa vida, o fórum 4x4 Brasil tem um tópico com todos os arquivos anexados. Siga o link http://www.4x4brasil.com.br/forum/showthread.php?t=25595 para obter os manuais.

Os manuais são bem detalhados, embora muitas intervenções exijam ferramentas especiais da Mitsubishi. Mas um motorista especialmente decidido pode obter tais ferramentas (cujas referências estão no texto) em lojas do exterior e fazer ele mesmo muita manutenção, ou no mínimo diagnosticar problemas com precisão.

terça-feira, 29 de março de 2011

Potência da TR4 no álcool

O preço do álcool definitivamente não compensa, mas vou rodar uns tanques com álcool na TR4 a título de "experiência científica". Para ver como anda, que média faz. O primeiríssimo tanque depois que saiu da concessionária fez 6km/l. Não deve fugir muito disso, ainda assim quero confirmar.

A média eu vou publicar depois de rodar um pouco mais; por ora o tanque está com 20l de gasolina (dos quais 25% são etanol) mais 50l de etanol, fazendo uma mistura "E80". Próximo da E85, a mistura que já está sendo muito utilizada nos EUA e na Europa -- com 15% de gasolina, já não é preciso injetar gasolina na partida a frio, e olha que lá faz muito mais frio.

Agora, o que eu já notei: anda muito mais, não é mais aquela "lerdeza" que é quase uma marca registrada da TR4.

O motor fica mais ruidoso também. Não chega a ser um ruído irritante como era o do tanque "inaugural", com o motor ainda sendo amaciado. É simplesmente ruído mais forte, condizente com a resposta mais forte.

Também há um "golpe" de potência a partir de 2000-2500 RPM. Esta característica é esperada em motores 16V, as pessoas até se acostumaram em falar que "precisa encher o motor" como se ele tivesse turbo. Na gasolina, esta sensação não parecia existir.

Claramente o comportamento do motor muda muito. Pegando os números de torque e potência do manual de instruções (*) e interpolando um pouco, podemos traçar o seguinte gráfico:


Apesar da pouca informação disponível, dá para concluir algumas coisas. A mais importante de todas é que o motor funcionando com álcool tem uma faixa de potência praticamente constante entre 4500 e 5500 RPM.

Dizendo de outra forma, mais dramática: atinge a potência máxima logo a 4500 RPM (138HP, para ser preciso).

Apesar da potência máxima do motor ser apenas 4% a mais no álcool (140HP x 135HP), ela "aparece" muito mais cedo. A 4500 giros, o motor é 15% mais potente com álcool (138HP x 120HP), uma diferença muito grande.

Claro que esta conclusão baseia-se numa interpolação da curva de torque da gasolina. Mas, mesmo assumindo que o motor a gasolina mantenha o torque de 20kgm a 4500 RPM, a potência seria de 125HP, contra os 138HP do álcool. Ainda é uma diferença de 10%.

Outras vantagens do álcool

Uma pergunta que volta e meia ronda o motorista de carro flex: afinal, para o motor, é melhor queimar etanol ou gasolina?

Segundo uma informação de "insider" de montadora, o álcool é melhor para a saúde do motor. O motor flex atual é na verdade um motor a álcool com taxa compressão um pouco menor (11:1 em vez de 12-14:1) e proteção contra detonação, de modo a poder queimar gasolina sem danos. Mas álcool vai melhor.

Os motores flex antigões eram basicamente o contrário: um motor a gasolina, com taxa de compressão de gasolina (9.5:1), com algumas melhorias para queimar álcool. Funcionava, mas o rendimento era péssimo, só era viável na época que o litro do álcool valia um real.

O motor flex atual da TR4 tem compressão 11:1, o que o coloca na primeira categoria (vai melhor com álcool).

Outra característica desejável de rodar com álcool é que o motor trabalha mais "frio", pois a mistura ar-combustível é mais rica, o que ajuda a refrigerar mais a parte superior do motor. (Em alguns motores, a mistura ar-gasolina é propositadamente rica só por conta disso.)

Assim, se for enfrentar estrada difícil ou trilha com a TR4, provavelmente álcool é decididamente a melhor opção: oferece mais potência e ainda refresca o motor.

Notas


(*) Números do manual: 20kg.m@2500RPM e 135HP@5500RPM para gasolina; 22kg.m@4500RPM e 140HP@5500RPM para álcool.

Para converter torque em potência, é preciso rememorar umas fórmulas do ensino médio:

potência (hp) = torque (kg.m) * pi (3.1415...) * 2 * RPM / 60 / 75

Exemplo: qual a potência usando álcool a 4500 RPM?

potência = 22 * 3.14159... * 2 * 4500 / 60 / 75
potência = 622035 / 60 / 75
potência = 138,23 HP

Outro exemplo: qual o torque a 5500 RPM, usando gasolina?

140 = torque * 3.1415926 * 2 * 5500 / 60 / 75
torque = 140 * 60 * 75 / 3.1415926 / 2 / 5500
torque = 18,23 kg.m

Outras igualdades úteis:
  • 1 HP = 75 kgm por segundo = 736 Watts
  • 1 kg.m (torque) = 9.81 N.m
  • kgm é uma unidade de trabalho, enquanto kg.m é de torque
  • 1 kgm = 9,81 Joules
Se utilizassem esse tipo de coisa como exemplo nas aulas de Física, pelo menos os alunos de sexo masculino passariam a interessar-se pela matéria :)

sexta-feira, 25 de março de 2011

Com que produto encerar o carro?

Duas coisas sobre as quais a gente ouve todo tipo de palpite furado: na criação dos filhos, e na limpeza automotiva. Graças a Deus, crianças são resistentes, porque se palpites furados fossem fatais, a humanidade já estaria extinta!

A pintura automotiva moderna também é bastante resistente, porque é frequentemente maltratada com produtos inadequados, mas nunca ouvi falar de alguém que precisou repintar o automóvel por usar detergente ou cera errados. Na pior das hipóteses, um polimento resolve.

Neste post pretendo falar de cera, mas não custa mencionar en passant que deve-se usar detergente automotivo (em pequena quantidade) para lavar o carro. Na falta deste, sabão de coco. São totalmente desaconselhados o sabão em pó e o detergente de louça.

Exceto pelo esmalte de porcelana (que tecnicamente é vidro, não tinta), toda superfície pintada com tinta é muito sensível e precisa de proteção adicional, fornecida por verniz ou cera.

Aplicar cera é muito mais fácil, mas é um revestimento que dura menos, e deve ser refeito periodicamente. E é por isso que temos de encerar nosso automóvel a cada poucas semanas, sob pena da pintura ir pro saco.

Além de proteger a pintura, a cera dá brilho adicional, porque preenche rugosidades microscópicas da tinta e torna a superfície mais lisa. A água corre mais fácil da lataria porque, como todo mundo sabe, água e cera não se misturam.

Agora, o próximo problema: que cera automotiva usar? Há uma infinidade de produtos no mercado, todos prometendo brilho, durabilidade e facilidade na aplicação.

As opções básicas são as seguintes:

  • Cera de carnaúba X cera sintética
  • Cera em pasta X cera líquida
  • Cera pura X cera limpadora X cera polidora (PERIGO)
A cera de carnaúba é a mais dura e com maior ponto de fusão que existe. Confere a maior proteção e o brilho mais profundo. Mas sua durabilidade não é das maiores, um mês no máximo, por ser um produto natural.

A cera sintética não proporciona tanto brilho, porém degrada mais lentamente; alguns tipos chegam a durar quatro meses.

A cera de carnaúba tem outras duas desvantagens: é muito cara e dura. Ceras convencionais (de supermercado) têm pouca carnaúba, para que tenham preço acessível e principalmente para que sejam fáceis de trabalhar. Ceras com alto teor de carnaúba são caríssimas e dificílimas de aplicar, coisa pra profissional que usa máquina para dar o brilho.

Entre as ceras comumente encontradas no Brasil, as pastosas, "de latinha", costumam ter carnaúba. As líquidas ou spray são quase sempre sintéticas. Um bom compromisso é aplicar cera com carnaúba a cada poucos meses, e aplicar cera líquida a cada poucas semanas. A cera sintética protege a camada original de carnaúba.

Infelizmente, é quase impossível achar cera pura no mercado. Todas as marcas conhecidas, em pasta ou líquidas, são ceras limpadoras e contém abrasivos. Aplicar tais ceras acaba fazendo um levíssimo polimento na tinta, portanto não se pode usá-las todo santo dia.

Na prática, antes de correr atrás de uma cera pura no Mercado Livre, eu penso o seguinte:

  • Cera pura só pode ser usada num carro perfeitamente limpo, idealmente depois de ser polido, do contrário as sujeiras incrustadas ficam lá, 'por baixo' da cera;
  • Na correria dos dias de hoje, dificilmente alguém tem tempo de manter o carro sempre limpo e brilhando. A gente acaba espaçando as lavagens e aí é preciso usar cera limpadora de qualquer jeito para remover coisas grudadas na tinta;
  • Milhões de motoristas limpam o carro com cera limpadora, milhares fazem questão de encerá-lo toda semana, e nem por isso as funilarias estão cheias de carros a fim de serem novamente pintados;
  • O uso de cera líquida (menos abrasiva) na maioria das aplicações diminui ainda mais o desgaste na pintura.
A cera "perigosa" é a cera polidora, que contém mais abrasivo, com o intuito de realmente polir o automóvel. Polimento é providência extrema para "ressuscitar" uma pintura mal cuidada, não é algo para ser feito a cada seis meses como alguns recomendam.

Há ainda a massa de polir, ainda mais agressiva, que deveria ser banida de supermercados e postos de gasolina, para evitar que alguém compre-a por engano, pensando que adquiriu uma cera.

quinta-feira, 24 de março de 2011

Engate e desengate 4x4

Uma dúvida recorrente é sobre o engate e desengate 4x4 da Pajero TR4. Mais especificamente, por que o status da tração não muda imediatamente no painel, depois de mexer a alavanca.

A caixa de transferência da TR4 (Super Select I) tem a grande vantagem de ser 100% mecânica. E por que isto seria uma vantagem? Porque esquemas elétricos são "famosos" por quebrarem fácil, deixando o motorista na mão, ou até impedindo o automóvel de andar. O sistema mecânico representa menos modos de falha num ponto tão crítico.

Talvez estes sistemas estejam melhorando. Nunca ouvi falar de problemas no sistema do Troller, por exemplo. Mas já ouvi diversas queixas em picapes e SUVs de luxo -- coisas do tipo ficar com o carro completamente bloqueado no meio do nada, e no fim conseguir destravar desconectando a bateria!

Com a Pajero TR4, você não fica na rua por problemas de tração 4x4. Isto é que interessa.

Porém... há uma parte do sistema de tração que é elétrica: a roda-livre do eixo dianteiro. Na tração 4x2, a roda-livre desconecta a roda esquerda do diferencial, o que (pela forma que o diferencial trabalha) também libera a roda direita, na prática isentando toda a transmissão dianteira.

Na verdade, a roda-livre é parte elétrica, parte a vácuo. A seqüencia completa de funcionamento ao engatar 4H é a seguinte:
  • motorista move a alavanca para 4H
  • sensor detecta posição 4x4 na alavanca
  • sensor de roda-livre indica desengatado
  • painel mostra estado 4WD "piscando"
  • solenóide direciona o vácuo do motor para roda-livre engatar
  • depois de rodar alguns metros, roda-livre consegue engatar
  • sensor da roda-livre indica engate OK
  • painel pára de piscar.
Ao mudar de 4H para 2H, a seqüência é a mesma, mas de baixo para cima.

O ponto é: a indicação de tração do painel fica piscando enquanto os sensores da caixa de transferência e da roda-livre divergem, ou seja, roda-livre está ainda engatada em 2H, ou ainda está solta em 4H.

O vácuo sozinho não é capaz de engatar ou desengatar a roda-livre; é preciso que os eixos girem com pouca carga por alguns metros, para o engate "balançar" e o vácuo conseguir deslocá-lo.

O controle do vácuo é feito pela peça da foto abaixo. Note os tubinhos coloridos de ar, listrados de azul e amarelo.


Esta peça está abaixo e à direita do comando do freio ABS (olhando o automóvel de frente para trás, com o capô aberto). Por completeza, o comando do ABS está ilustrado abaixo, embora ele não tenha nenhuma relação com a roda-livre.



A roda-livre é construída de forma a engatar sem vácuo, e desengatar com vácuo. Além disso, engata mais facilmente que desengata, dada a mesma força.

Por conta disso, o painel fica piscando mais tempo ao "descer" para 2H. Também pisca às vezes quando o motor está desligado (quando não há vácuo para atuar a roda-livre).

Se o sistema falhar, a roda-livre permanece engatada. Isto pode parecer ruim, mas na verdade é bom: não há dano imediato, apenas maior desgaste. E não fica sem tração 4x4 se houver falha justo no meio de um lamaçal...

Como o leitor deve ter notado, o sistema de roda-livre é mais complexo e cheio de pontos de falha, praticamente o oposto da caixa de transferência. E de fato ele costuma apresentar pequenos defeitos em Pajerinhos mais velhas.

Possíveis defeitos (a maioria fácil de resolver):
  • falha no sensor da caixa de transferência (que deixa de atualizar o painel e comandar a roda-livre);
  • falha no sensor da roda-livre (painel fica piscando mesmo com roda-livre corretamente atuada);
  • tubos de vácuo entupidos por sujeira;
  • mau contato ou fio solto na ligação ao sensor;
  • solenóide com problemas.
De longe o defeito mais comum é sensor; o segundo mais comum é a roda-livre não conseguir desengatar. Ambos são problemas que não impedem de dirigir o carro até o destino, para no outro dia levar ao mecânico. Afinal, o modo 4H da tração pode ser usado de forma permanente.

Em carros mais velhos, o sistema de roda-livre pode estar desgastado, e não consegue mudar de 4H para 2H apenas andando para frente. É preciso dar uma rezinha também. O próprio manual da Pajero sugere fazer isso caso a roda-livre não desengate (e o painel continue piscando).

Defeitos de nascença comuns

Pelo que tenho lido em fórums diversos, a Pajero TR4 é um carro resistente, que incomoda pouco e dura muito.

A principal evidência empírica disto é o ativo comércio de Pajeros TR4 e iO usadas, alcançando bons preços mesmo para modelos com 10 anos de uso. (A propósito, iO era a denominação internacional deste modelo, que foi abandonada no Brasil por lembrar "1.0".)

Naturalmente, não chega a ser como as veneráveis Pajero Full e GLS-B. Não é raro ver Pajeros 1993 sendo vendidas por R$ 30 mil ou mais. Isso mesmo com a fama de peças caras e difíceis de encontrar etc.

Voltando à TR4, existe entretanto uma "lista" de defeitos recorrentes, que os usuários notam pouco depois de tirar o carro na concessionária, ou que manifestam-se durante a vida do carro.

Alguns dizem que é problema de controle de qualidade da Mistubishi brasileira (que é uma empresa independente, não é uma subsidiária da MMC japonesa, e produz os carros sob licença). Que as iO outrora importadas não tinham tais problemas etc.

Outros acham que é questão de projeto, e todo automóvel tem "calcanhares de aquiles" do gênero. Nenhum dos problemas é showstopper.

De um jeito ou de outro, é bom ter os problemas mais comuns em mente e ficar de olho quando for retirar o carro novo, ou para notificar a concessionária na primeira revisão especial (5000Km).

Os problemas recorrentes que apurei foram:

  • Portas desajustadas, o que na prática permite entrada de água, poeira, ou barulho de vento acima de certa velocidade. A chance deste defeito de fábrica aparecer é maior nas portas traseiras.
A minha TR4 faz um leve barulho de vento acima de 100 Km/h. A princípio pensei que fosse a aerodinâmica, mas os relatos de portas fora de esquadro no fórum me fazem acreditar que também fui "brindado" com um leve desajuste (ao menos não entra água nem poeira).
  • Correia do alternador "cantando", ou seja, patinando. A TR4 atual tem três correias: a dentada (oculta), a da direção hidráulica/ar condicionado, e a do alternador. É esta última que às vezes patina.
Pode ser problema de qualidade da correia ou folga excessiva, as opiniões variam. Pode ser até umidade. A correia da minha TR4 patinou uma única vez, por 2 ou 3 segundos, num dia de chuva em que o carro saiu "frio" e com muitos equipamentos elétricos ligados (ar, faróis, limpador). Ligar tantos equipamentos faz o alternador ficar mais pesado de girar.

Por ter sido uma única vez, não classifico o acontecido como defeito, mas o fato é que isto nunca aconteceu com nenhum outro automóvel que eu tive.

  • Estalos na suspensão dianteira: quando a suspensão é exercitada, em buracos, erosões etc. ela estala, principalmente quando esterçada

Este é o problema mais assustador e o mais difícil de julgar, porque parte dos estalos é "normal" (aparentemente derivado do design) e parte é "anormal", curável com ajuste, engraxamento ou reaperto.

Pessoalmente notei alguns estalos (audíveis com o vidro aberto, não daqueles que fazem o carro vibrar todo) quando enfrentei uma estrada bem difícil, cheia de erosões cavadas pela chuva. Não me preocupou, mas me fez lembrar que outros usuários reclamaram da mesma coisa. Não custa mencionar na próxima revisão.

  • Rachaduras nos faróis e/ou entrada de água nos mesmos
Parece ter sido um problema de qualidade nas peças ocorrido no ano de 2009, e já sanado. Espero não ser acometido por ele.
  • Vibração no motor em marcha-lenta. Com o motor em marcha-lenta e quente, o carro vibra um pouco, como se um cilindro estivesse falhando, mas o ruído do motor está normal. Acontece às vezes, não sempre.
Muita gente interpreta isto literalmente como falha, daí a preocupação. Eu ainda acho que não é nada sério. Mas tenho um palpite para a origem do problema: a injeção flex.

Tive um outro carro que fazia isso mas andando, quando pisava o acelerador em um terço; parecia que o motor falhava, mas acelerar mais a fundo fazia o problema sumir. Geralmente acontecia depois de trocar o combustível de gasolina para álcool, mas eventualmente surgia depois de vários tanques cheios com o mesmo combustível.

quarta-feira, 23 de março de 2011

Som original da Pajero TR4 2011

O som da Pajero TR4 nova é um Clarion CX609, tamanho DIN duplo. Há seis alto-falantes: dois na porta dianteira, dois nas colunas traseiras e dois tweeters nas colunas dianteiras.

O player tem o que espera de uma aparelho fabricado nesta década: rádio, CD, entrada USB para pendrive ou iPod, Bluetooth. Um toque inteligente foi alocar a tomada USB dentro do porta-luvas, com conexão flexível, a salvo de um encontrão e de mãozinhas infantis.

O aparelho é menos "integrado" ao automóvel que outros modelos de fábrica. Não há botões no volante, o aspecto do player não segue o padrão do resto do painel. Nisto, segue a "filosofia" do resto da TR4, onde cada subsistema é bastante independente dos demais, sem muita integração.

Instalar o aparelho na loja da esquina daria na mesma, exceto pela comodidade de sair com o carro completo da concessionária. Aliás, o tamanho padrão torna fácil trocar o aparelho, quiçá por um DVD player com GPS...

Qualidade de som

A qualidade de som é sofrível, como toda sonorização de fábrica que já tive oportunidade de ouvir.

Certamente os alto-falantes são de qualidade medíocre. Felizmente são todos de 6 polegadas, assim é fácil achar substitutos excelentes. Pessoalmente recomendo as marcas Bravox e Fosgate. Não as usei (ainda) na TR4 mas sim em automóveis anteriores. A propósito, existem excelentes falantes de 6,5" destas marcas; vale a pena verificar se cabem, pois a qualidade é realmente superior.

Os tweeters têm a medida interna de 1 polegada e externa de 4 centímetros, também parece ser um padrão.

Os encaixes nas colunas e portas são muito fáceis de retirar. Em tese a troca dos alto-falantes pode ser feita por qualquer pessoa com um mínimo de conhecimento em som, e armada de um ferro de soldar.

Dito tudo isso, e considerando que sou "chato" em relação a qualidade de som, devo dizer que não mexi na instalação original, nem pretendo fazê-lo tão cedo, pois considero-a suficiente para uso casual.

Para a galerinha que gosta de incomodar o sossego público, há bom espaço para instalar módulo e subwoofer na traseira. Dizem que um sub de 12" embutido num dos lados já fica excelente. O player original Clarion possui saídas RCA, pode-se aproveitá-lo num som "bombado" se o orçamento estiver apertado.

Recursos do Clarion CX609

Para as operações triviais, como mexer no volume ou avançar música, a ergonomia do aparelho é suficiente, os comandos no volante nem fazem falta.

Por outro lado, o acesso aos recursos avançados é bastante complicada, praticamente impossível de destrinchar sem o auxílio do manual de instruções (que também é pessimamente redigido). Sou engenheiro e sofri bastante; fico imaginando como se sairia uma pessoa sem background técnico... Não entendo porque aparelhos desse gênero são tão pouco amigáveis com o usuário.

O aparelho tem uns recursos que parecem interessantes e vêm ativados por padrão: reforço de graves e "melhoramento" de música em MP3. Na prática, só tornam o som mais artificial e irritante (mas muita gente associa estridência a qualidade e nitidez, e percebem a música como "melhorada" mesmo). Desnecessário dizer que desativei todos eles meia hora depois de tirar o carro da loja.

Um recurso em particular é bem-vindo e útil: o equalizador paramétrico. Apesar do acesso ser (surpresa!) pouco amigável, ele realmente ajuda a compensar as limitações dos alto-falantes, e ajustar o timbre a seu gosto pessoal, e sem introduzir distorções.

Bluetooth

Eu era duplamente cético em relação a Bluetooth no carro: não acreditava que funcionaria, nem que seria compatível com meu celular (um HTC Desire, baseado no sistema Android). Mas funciona!

O pareamento do Clarion com o celular é complicado de achar e fazer; sempre o problema da interface pouco amigável. Uma vez feito isto, basta entrar com o celular no carro que os aparelhos conectam-se automaticamente. Vários celulares podem ser pareados com o mesmo player.

Duas funções do celular passam para o player: falar ao celular (handsfree), e ouvir música. Se você tiver uma coleção de músicas no celular (talvez ouça no trabalho, ou ao caminhar etc.) pode executá-la também dentro do automóvel.

É possível até discar via player, mas (pra variar) é uma operação meio complicada. Mais fácil parar e discar pelo próprio celular.

Consumo de combustível da TR4

 Muita gente reclama do consumo da Pajero TR4. Em termos absolutos, de fato é um carro beberrão.

O pessoal conta histórias de terror por aí, Pajerinhos fazendo média de 4 Km/l com gasolina. Minhas médias até agora, com o motor bastante novo ainda, têm sido menos assustadoras: 8 Km/l cravados com gasolina, 6 Km/l com álcool. O uso é misto urbano/rodoviário, o câmbio é automático.

Diz a lenda que, em uso estritamente rodoviário, respeitando limites de velocidade e com câmbio mecânico, a TR4 faz 10,5 Km/l. É para ser um número animador, mas na verdade este é o limite máximo, quase inatingível em uso normal.

Ok, mas uma média de 8 Km/l é bom ou ruim? Comparando com outros carros cujas médias eu acompanhei de perto:

  • Clio 1.0 16V: média de 11 Km/l com álcool, 15 Km/l na gasolina. Peso: 900kg
  • Clio 1.6 sedã: média 9 Km/l com álcool, 13-14 com gasolina. Peso: 1020kg
  • S10 4.6 V6 cabine simples: média de 7,5 Km/l com gasolina uso misto, 9-10 Km/l em estrada (dependendo do pneu). Peso: 1650kg

Considerando que a Pajerinho tem 1450kg (quase tanto quanto a S10) e a minha em particular tem câmbio automático, os números estão mais ou menos de acordo, embora surpreenda que um automóvel de 2011 consuma quase tanto quanto uma picape de 1997.

Além do peso e do câmbio, diversos outros fatores concorrem para o alto consumo da TR4:

  • Aerodinâmica péssima, por ser quadradinho e alto;
  • Pneus largos, de uso misto, pioram muito o consumo;
  • Transmissão dianteira não tem roda-livre, diferencial e cardan estão sempre girando.
Além do consumo, muita gente reclama da performance da TR4. Pessoalmente, acho o desempenho dela "suficiente". Não tem o veneno da S10 V6, mas não deixa a desejar como um carro 1.0.

Não sou muito de correr, mas a verdade é que jipe não foi feito para correr. O "padrão ouro" dos jipes, a Land Rover Defender, tem motor de 120HP e pesa mais que a TR4. E ninguém reclama que a Land é lerda...

Claro que há contra-exemplos, como o Troller e seu monstruoso motor diesel de 163HP. E como sabemos, a potência diesel "vale mais" que a do motor a gasolina, pois é atingida rápido, em RPM bem mais baixa.

O motor da Pajerinho é o 4G94. É um motor subquadrado (curso do pisão maior que o diâmetro), o que significa torque plano e abundante em detrimento da potência final. Perfeitamente apropriado para um veículo off-road. Até o ronco do motor é grave e harmonioso, sugere cilindrada bem maior que 2.0.

Além das escolhas de engenharia, é preciso reconhecer que o 4G94 não é o motor mais avançado do universo. Por exemplo, ele ainda usa acelerador com cabo até a borboleta, enquanto muitos automóveis "populares" usam acelerador eletrônico.

Esta defasagem tecnológica aparece em outros componentes da TR4, como na transmissão automática. Os amantes da TR4 dirão que ela tem um projeto conservador, privilegiando confiabilidade e robustez. Os detratores dirão que ela é defasada mesmo. Provavelmente ambos têm um pouco de razão.

De qualquer forma, o 4G94 não é "velharia sendo mandada para o Brasil". É um motor que a Mitsubishi utiliza em outros automóveis no resto do mundo. Uma versão particularmente interessante é o equipado com GDI (injeção direta de combustível) - que infelizmente depende de gasolina de alta qualidade, e não veremos tão cedo por aqui.

Muita gente acha que a adaptação flex da TR4 "estragou" o motor, mas o sistema de admissão é de um fabricante renomado na área (Magneti-Marelli), e o aumento da taxa de compressão para 11:1 cai bem para a gasolina brasileira, que tem 25% de álcool.

Ideal mesmo seria aumentar a compressão para 15:1 e queimar apenas álcool. Ficaria um canhão... mas vai que ocorre uma crise de abastecimento como em 1990?

terça-feira, 22 de março de 2011

O mistério dos diferentes modos 4x4

Uma fonte permanente de discussão e confusão é a multiplicidade de modos 4x4 oferecidos pela Pajero TR4 (e Full).

O ponto nevrálgico é tal modo 4x4 permanente (4H). O manual de instruções até tenta, mas não deixa perfeitamente claro para que ele serve, nem como ele se equivale aos modos 4x4 de outros veículos.

É mais fácil lidar com o "problema" eliminando primeiro os outros modos de tração, que são mais simples de entender:
  • 2H: apenas rodas traseiras.
  • 4HLc: Tração 4x4 "bloqueada". A mesma rotação e torque são transmitidos para os eixos dianteiro e traseiro.
  • 4LLc: O mesmo que 4HLc, porém com uma redução adicional na transmissão. Anda mais devagar, porém tem mais força. Bom para andar quase sem acelerar, ou em subidas muito íngremes.
A tração 4x4 bloqueada não deve ser utilizada em estradas pavimentadas secas, porque às vezes os eixos dianteiro e traseiro devem rodar a velocidades diferentes -- principalmente quando se está fazendo curvas. A diferença tem de ser compensada pelo deslizamento de algum pneu, o que é muito difícil quando a aderência é boa. A transmissão é bastante forçada.

Do modo 2H, a grande vantagem é poupar combustível, pois menos engrenagens estão trabalhando. Uma vantagem menor é poupar os componentes da transmissão dianteira.

Resta então o modo 4H, a nossa nêmesis. Em 4H, a transmissão para os eixos é feita por diferencial central, que compensa diferenças entre os eixos, de forma semelhante aos automóveis com tração 4x4 permanente (AWD).

A caixa de transferência Super Select I que vem com a TR4 divide igualmente o torque entre dianteira e traseira. A caixa SS-II, que vem com a Pajero Full, manda apenas 33% do torque para a dianteira.

O modo 4H pode ser usado em qualquer piso, o tempo todo, mas tem uma desvantagem teórica: se apenas uma roda patinar ou sair do chão, todas as demais perdem tração, limitando muito a utilidade deste modo.

Nos melhores automóveis AWD, este problema é remediado com diferenciais de deslizamento limitado e/ou controle de tração. Na Pajero TR4, o deslizamento do diferencial central é limitado pelo VCU.

VCU: unidade de acoplamento viscoso

O VCU é uma espécie de embreagem viscosa. Antes de mais nada, é importante mencionar que o VCU não é mágico. Ele é apenas uma forma barata de implementar deslizamento limitado. Há formas melhores, porém muito mais caras (diferencial Torsen).

O formato é de uma panelinha com um eixo protuberante. Este eixo é ligado a uma saída do diferencial central. A carcaça da "panelinha" está acoplada à outra saída. O VCU atua quando há movimento relativo entre carcaça e eixo (ou seja, quando as saídas do diferencial giram a velocidades diferentes).

Dentro do VCU há diversos discos ranhurados, muito próximos uns dos outros mas sem se tocarem. Os discos são conectados alternadamente a cada eixo, e o espaço vazio é preenchido com um líquido especial. O tal líquido engrossa conforme sua temperatura aumenta.

Quando os dois eixos giram à mesma velocidade, não acontece nada. Quando giram a velocidades diferentes, o movimento relativo entre os discos do VCU movimenta e aquece o líquido. Conforme o líquido engrossa, vai acoplando, de forma suave e proporcional, os dois eixos.

O efeito final desejado é que, quanto maior a diferença entre eixos, mais torque seja transmitido ao eixo "lento". Mesmo com uma roda patinando, as rodas do outro eixo continuam tracionando (embora menos do que no modo 4HLc bloqueado).

O aquecimento do líquido não é instantâneo, então o VCU demora uns instantes para "agarrar". Mas o líquido frio é viscoso o suficiente para fornecer um acoplamento parcial, desde o primeiro momento.

Na prática

Em resumo: os modos 4x4 da Pajero TR4 funcionam. Fazem o carro passar com estabilidade onde outros dançariam ou até atolariam.

Numa estrada pavimentada, não dá pra notar diferença alguma entre 2H e 4H.

Numa estrada de chão, em particular numa subida, usar o modo 4H em vez de 2H diminui sensivelmente as patinagens na roda traseira.

Já que o modo 4H pode ser usado continuamente, é uma boa ideia utilizá-lo em estradas rurais, bem como em piso molhado, em particular se escorregadio, como calçamento de pedra. (Um jipe é menos estável que um carro "normal". Qualquer recurso que compense esta inerente deficiência é bem-vindo.)

Numa estrada bem arenosa (estou falando de estrada, não de beira de praia!) o ganho de estabilidade com 4x4 fica bem mais evidente. Em 2H o carro "dança" bastante. Em 4H ele dança bem menos. E em 4HLc ele parece estar andando sobre trilhos. O volante também fica mais duro em 4HLc.

Em lama, a mesma coisa. O carro dança um pouco em 4H até o VCU "engatar". Passando no mesmo lugar em 4HLc vai quase tão reto quanto no asfalto, desde que esteja tracionando e não freando.

Em terrenos arenosos, tipo beira de praia, duna, etc. o ideal é ir de 4HLc ou até 4LLc, pois o atraso do VCU pode causar uma atolagem. Por outro lado, passar em 4HLc é humilhação. Onde os outros carros têm de passar correndo, ou atolam, a Pajero passa como se fosse uma rua qualquer.

Lembre-se da velha máxima do 4x4: engate a tração antes do obstáculo, não quando está atolado nele.

Mudança em velocidade

Outra dúvida recorrente é se a tração 4x4 (4H e 4HLc) pode ser engatada em velocidade. Sim, na Pajero TR4 pode, porque o diferencial dianteiro já está rodando de qualquer maneira, vai apenas acoplar partes que estão girando à mesma velocidade.

As recomendações são: estar em linha reta, não estar acelerando, e a menos de 100Km/h. Estar em linha reta garante que ambos os diferenciais estão rodando igual. Não acelerar garante uma troca suave, sem carga, e evita a possibilidade de uma roda estar patinando.

A velocidade máxima de 100Km/h não parece ter nenhuma razão especial, pode ser apenas uma forma genérica de poupar o sistema, ou evitar um acidente feio em caso de problemas.

A tração reduzida (4LLc) só pode ser engatada/desengatada com o veículo parado.

Diferenciais e patinagem

Os modos 4HLc e 4LLc bloqueiam apenas o diferencial central. Os diferenciais dianteiro e traseiro ainda estão sujeitos ao problema de distribuição de torque: se um lado patina, o outro recebe pouco torque.

Consta no manual que a TR4 tem diferencial traseiro de deslizamento limitado. Alguns dizem que na verdade não tem, que foi erro de tradução do manual etc. O manual técnico do Pajero Pinin (em inglês) diz que há. Não achei uma resposta definitiva sobre isso, e não estou a fim de desmontar o diferencial da minha TR4 para conferir.

UPDATE: a TR4 não tem diferencial de deslizamento limitado.

Na prática, as rodas traseiras patinam pouco, A TR4 tem excelente distribuição de peso, o que também ajuda a diminuir patinagem.

O fato é que diferencial de deslizamento limitado é suficiente apenas para uso "normal". Para off-road sério, do tipo passar por erosões, escalar trechos rochosos etc. o bom mesmo é bloqueio total com comando no painel. Parece que há kits para adaptar nos diferenciais da TR4, em torno de 2 mil reais cada.

Afinal, Pajero TR4 é SUV ou jipe?

É difícil classificar a Mitsubishi Pajero dentro dos padrões usuais.

Por exemplo, um Hyundai Tucson é claramente um SUV. O Troller, o Jeep Wrangler, o TAC Stark são jipes sem sombra de dúvida. Uma picape Nissan Frontier é uma... picape. Os crossovers também são facilmente reconheciveis.

Mas, e a Pajero? Quando fui comprar a minha TR4, um amigo disse:
"Veja bem se é o que você quer. Ela [TR4] é um jipe, não um SUV".
Já nos fóruns 4x4, ouvi exatamente o contrário:
"Se quer um SUV compre TR4; se quer jipe, compre Troller".
E aí, o que vai ser?

Depois de ouvir tantas opiniões e principalmente depois de ter experimentado o veículo, cheguei a seguinte conclusão: Pajero é Pajero, é um tipo sui generis de carro. Não é SUV, nem jipe, nem crossover.

Muitos diriam que a definição de SUV (Sport Utility Vehicle) engloba jipes, crossovers e assemelhados, portanto Pajero é SUV. Não aprecio muito este reducionismo, acho que o protótipo do SUV tem características bem específicas: uso eminentemente urbano, acabamento luxuoso, alta performance e grandão.

Existem diversos modelos de Pajero: TR4, Sport, Full "curtinha" 3D e Full "comprida". Cada uma tem um caráter um pouco diferente.

A Pajero Sport é a mais "simples" de entender. Ela tende mais para um SUV, visa atender um público que deseja um automóvel grande, potente, confortável e luxuoso com um pouco menos de capacidade off-road.

A principal característica que carimba "SUV" na Sport é a falta da tração 4x4 permanente, que as outras têm. A Sport possui apenas 4x4 travado (para estradas não pavimentadas, lama etc.) semelhantemente à picape L200. Surgiram até boatos que iam lançar uma Sport 4x2, mais barata.

A Pajero Full é uma festa de recursos: todas as capacidades de um jipe, boa de off-road, além de luxuosa, potente e recheada de recursos eletrônicos.

A TR4 é mais jipe que a Sport, pois possui a mesma capacidade 4x4 contínua que a Full. Seu acabamento é espartano para um veículo de sua faixa de preço, e há pouca eletrônica embarcada. É mais confortável que um jipe, porém menos que um SUV típico. Sua estabilidade em estrada é razoável mas o motor é insuficiente para andar realmente rápido.

Por outro lado, a TR4 não tem a flexibilidade do jipe em termos de adaptações. O carro é bastante bom fora da estrada assim como vem de fábrica, mas é difícil ir além. É complicado mudar curso da suspensão, colocar pneus diferentes etc. Isto impede o uso da TR4 em off-road mais "hardcore".

Em minha opinião, estes recursos fazem da TR4 a Pajero com mais personalidade de toda a família.

Ela é única não só no pacote de recursos, mas também na sua faixa de preço. Qualquer outro veículo que concilie tantas propostas (4x4, conforto, beleza estética) custa 50% mais. Enquanto isso, a Sport concorre com e.g. Hyundai VeraCruz, e a Full concorre com Land Rover.

Na verdade,  o Suzuki Vitara (não o Grand Vitara) tinha proposta semelhante à TR4. Parece que a Suzuki está voltando ao mercado automotivo brasileiro com o interessante jipinho Jimmy.

Talvez possamos criar uma classe de veículos denominada "jipinhos japoneses" e classificar TR4 como tal ;)

Cortando a fita inaugural

Seja bem-vindo. Como o próprio nome do blog sugere, aqui só falamos de Pajero TR4.

A ideia de criar um blog exclusivo para o modelo nasceu da minha experiência pessoal. Adquiri uma Pajero TR4 Flex 2010, e tenho acumulado impressões que gostaria de compartilhar com outros donos de TR4 (e com potenciais compradores). Além disso, tenho pesquisado muito em forums de 4x4 para fazer o melhor uso do novo "brinquedo".

Pensei primeiro em escrever uma resenha ou avaliação da TR4, mas ficaria demasiado longa. Além do mais, haveria uma mistura de informações minhas e dicas de terceiros, aí teria de pontilhar o texto com citações às fontes etc. Submeter artigos menores, que falam sobre um tópico de cada vez, parece ser o formato ideal.

Por diversos motivos a "Pajerinho" é um carro único em sua categoria, com forte personalidade. Sem sombra de dúvida a TR4 merece ter seu próprio blog. E se tudo der certo, terá também seu próprio fórum de discussão num futuro próximo.